11.5.15

Doido varrido

Encontrei o tipo com cara de marciano sentado no mesmo banco de passeio do outro dia.

Parecia triste e inquirido sobre o regresso adiantou-me que o mesmo fora suspenso, porque tinha sido informado que vinham aí uns dias de sol muito semelhantes aos que ocorrem por aqui durante o verão.

Tinha curiosidade em viver uns dias de calor a rondar os trinta graus centígrados, pois que lá na galáxia dele era coisa que não acontecia há muitos e muitos anos.

Se fosse preciso adiar a partida por mais uns dias não haveria de vir mal ao mundo e muito menos a esta terra que não deve nada a ninguém e não está comprometida com coisa alguma nem com um tipo com cara de marciano oriundo de uma longinqua galáxia no fim dos seus dias.

Llá lhe fui dizendo que essa coisa de querer experimentar uns dias de calor dos princípios do verão não era matéria de se menosprezar e ele deveria aproveitar tempo se é que lá na sua galáxia o sol já deu o que tinha a dar há muito tempo.

Mas aquelas ideias de que não devemos nada a ninguém e que não estamos comprometidos com coisa alguma é assunto sobre o qual ele, o marciano, tem informações um tanto ou quanto contraditórias.

Não me disse a quem terá ouvido que não se deve nada a ninguém nem que não temos compromissos com quem quer seja, mas a realidade parece não estar lá muito de acordo com essas opiniões.

Lá me foi dizendo que essa história de os cofres estarem cheios, que os mercados já confiam no pessoal, que os investidores já emprestam dinheiro, que as exportações estão um mimo, que a barragem do alqueva está cheia, que agora o que faz falta é os alentejanos trabalharem e não viverem à sombra da azinheira que nem sabe a idade, são vozes da reação que só servem para denegrir este país maravilhoso, que se tornou maravilhoso há pouco mais de três anos.

E continuou a dizer-me que lá na galáxia dele os empréstimos obtidos pelos particulares e pelo seu governo serviam para pagar as dívidas que eventualmente tinham sido contraídas em momentos de aflição e que não entendia lá muito bem porque é que os cofres daqui estão cheios de dinheiro se a coluna do dever é mais larga que o comprimento do túnel do rossio e até do marquês, onde teve a oportunidade de encontrar um dormitório de pessoal esquecido e ignorado por um governo que se preza de tratar bem os seus eleitores.

Claro que tive de lhe explicar que aqui na nossa terra, apesar deste sol maravilhoso, os empréstimos concedidos pelos mercados e pelos investidores estrangeiros não se destinavam a pagar a dívida mas sim a pagar os juros dessa tal dívida, procurando-se sempre que se mantenha ao mesmo nível, evitando-se a todo o custo que ela ultrapasse os valores actuais.

Coisa esquisita esta vossa terra… terei que partir se não quiser ficar doido varrido.


 

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