20.5.10

A austeridade

Estavam os Portugueses muito atentos a tudo o que ia acontecendo na visita de Sua Santidade o Papa que nem estranharam a aparição do Primeiro Ministro na televisão para anunciar o pacote de austeridade que Bruxelas determinara uns dias antes.

É da vida: quem quer pertencer a uma comunidade de cidadãos consumidores de trezentos milhões, com uma moeda única de várias nações, vê-se a braços com coisas desta natureza, como é a perda da independência económica, sacrificada aos interesses da União.

Parece que toda a gente já esperava por tudo isto depois de ter tomado conhecimento de uma pequena parte do conteúdo do PEC.

Toda a agente menos os bloquistas, os comunistas e centristas, que de imediato levantaram as suas vozes lançando ao vento as devidas e esperadas imprecações contra os capitalistas de direita, incluindo os socialistas e os sociais-democratas, que se uniram para lixar mais uma vez o Zé Povinho.

Já ficou o recado: luta sem quartel, combate em todas as frentes, manifestações sempre e quando for necessário, porque o direito à indignação contempla tudo isto, mesmo quando os representantes políticos de mais setenta por cento de votantes dizem que se trata de coisas totalmente indispensáveis para a política nacional.

Certamente que todos aqueles que concordam com estas medidas mesmo que as sintam fortemente e negativamente nas suas carteiras lá terão as suas razões que justificam a sua concordância, do mesmo modo que aqueles que as criticam e não concordam e as rejeitam totalmente lá terão também as suas razões para tais atitudes.

Estamos perante uma situação que muitos não atendem nem encontram justificação para a sua génese e muitos outros nem sequer fazem a mínima de como foi possível isto ter acontecido, sendo certo que uma catástrofe desta natureza não atinge apenas Portugal mas é comum a muitos outros países, muito embora não se manifeste nem se justifique da mesma maneira.

Cá por mim a coisa não assume foros de extrema gravidade por duas razões fundamentais: há muito tempo que não tenho possibilidade de fugir ao pagamento integral de impostos; depois já estava à espera de tudo isto quando não fiz e ainda não faço a mínima ideia de como tudo isto aconteceu e de como vai terminar.

Embora continue a pensar que os economistas e espertos em finanças deveriam ocupar-se prioritariamente da produção agrícola ou dedicarem-se à engenharia dos solos, o meu optimismo começa a diminuir drasticamente a ponto de por em causa a notícia do crescimento do PIB em um por cento no primeiro trimestre do ano corrente, sem que os economistas se tivessem dado conta, entretidos que estão com a má-língua.

19.5.10

A Reportagem

Eram cerca das catorze horas quando Sua Santidade o Papa Bento XVI dava como terminada a visita a Portugal e regressava à Cidade Eterna.

Não tive a possibilidade de acompanhar as reportagens da visita nos diversos meios de comunicação social, mas deu para ter a percepção que as multidões nunca deixaram de acompanhar o Papa.

Tanto na Praça do Comércio em Lisboa, como em Fátima e por fim na cidade do Porto os Portugueses foram exímios e pródigos nas manifestações a Sua Santidade, demonstrando que a crise não foi suficiente para fazer com que a presença do Povo não se fizesse sentir: sempre esteve presente, apesar de o tempo não ter sido totalmente favorável para os banhos de multidão, que aconteceram sempre que o Papa se prestou a isso.

As televisões esmeraram-se na cobertura de toda a visita papal, principalmente a televisão pública e aquela que foi a televisão da Igreja, mas que agora já não é, apesar de guardar alguns resquícios de tal qualidade.

Ouvi milhentos comentários e umas tantas mais observações das dezenas de repórteres televisivos envolvidos na cobertura informativa de todos os acontecimentos da visita papal.

Ouvi coisas muito acertadas, coisas que demonstravam claramente que se conhecia o assunto e que se percebia da poda. Ouvi muitos comentários onde se vislumbrava uma muito boa vontade de prestar um bom serviço informativo a quem estava em frente do televisor. Ouvi muitas observações que demonstravam claramente que se tinha preparado a matéria com algum trabalho de casa que deu origem a um trabalho sério e honesto e certamente apreciado por quem esteve em frente do televisor.

Como em todas as coisas, há sempre um senão.

Lugares comuns aos molhos, enganos ao desbarato, trocas contínuas, entrevistas falhadas, recolhas de opiniões como se fossem entrevistas, perguntas descabidas, observações fora do contexto, descrições como relatos de futebol... de tudo isto vimos um pouco.

O que vem provar que a posse de um microfone não é suficiente para termos um bom jornalista ou um bom observador, como não é suficiente para tal ter um curso superior ou ter um palmo de cara sugestiva e sorridente.

Por outro lado, as diversas tentativas de adivinhar o que o Papa queria dizer ou o significado de algumas expressões proferidas por diversos intervenientes demonstram também que há por aí jornalistas que não sabem ou ignoram de propósito o contexto e as circunstâncias das suas intervenções.

Estava a ver que algum (a) ainda perguntava ao Papa "... o que pensa da subida de impostos...".